Sem Estado, periferias criam alternativas para democratizar alimento livre de veneno

03/09/2019 08:36

Ainda que o direito ao alimento adequado e saudável faça parte do artigo 25 da Declaração Universal dos Direitos Humanos e a alimentação de boa qualidade esteja prevista no artigo 6º da Constituição Federal, o consumo de produtos sem veneno ainda se limita a uma parcela abastada da população, como mostrado na primeira reportagem do Joio sobre acesso a orgânicos.

Entre as dificuldades enfrentadas pelas populações das periferias, sobretudo das grandes cidades, uma das principais barreiras é física: a falta de acesso a feiras livres e a estabelecimentos que comercializam produtos a preços mais acessíveis.

A contradição é forte. Na periferia produtora de insumos e tecnologia prevalece a teoria do “balde furado”, em que, por mais que os moradores “encham” o espaço de riqueza, os “furos” do recipiente ainda jorram nos grandes centros urbanos. É neles que o trabalhador periférico “vende mal” a sua força de trabalho e consome não dentro, mas fora dali.

“O acesso à periferia é negado à própria periferia”, diz Kim Alecrim, arte-educadora para alimentação saudável da Casa Ecoativa, na Ilha do Bororé, extremo sul da cidade de São Paulo.

Segundo ela, a população local ainda considera caro pagar 0,50 centavos a mais em uma alface orgânica e opta pela variedade hidropônica com agrotóxicos do supermercado do Grajaú.

Nada espantoso. O acesso à alimentação também passa pela crueldade do capitalismo.

“O imediatismo, a falta de dinheiro e a necessidade derrubando a porta faz economizamos todo e qualquer centavo. A pessoa opta por comer o envenenado de 2,50 do que o orgânico de 3 reais, porque esses 0,50 vão pro pão do café da manhã do outro dia”, desabafa.

Seguindo a geografia da região, é possível enxergar a desigualdade de abastecimento que prejudica as periferias que, ao contrário do que o estereótipo determina, não são espaços caracterizados pela escassez.

“Nós sofremos com a vulnerabilidade sim, mas do ponto de vista da política pública, que não chega. E o Estado, quando vem, é truculento. Ele não vem para colaborar”, lembra Jaison Pongillupi, permacultor e educador na Ecoativa.

É a partir da transposição de uma barreira geográfica que se inicia também o rompimento com a visão limitada da periferia como lugar de falta e fragilidade, e se passa a enxergar as bordas como território educador.

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